Futebol: Uma Desculpa para Ser Feliz!
Foi durante uma atividade universitária que me deparei pela primeira vez com o ScoutDecision. Naquele dia, o Miguel mostrou-me que até alguém com um percurso aparentemente distante do futebol (sim, somos engenheiros) podia ter um impacto significativo neste belo jogo.
A partir desse momento, senti-me como uma criança com um sonho, alimentado por uma obsessão por dados. (Aliás, Moneyball é uma obra-prima!) O meu objetivo para a tese de mestrado era claro: identificar jogadores tecnicamente dotados em ligas inferiores que pudessem desempenhar ao mesmo nível que aqueles em competições de topo, deixando que os dados se expressassem e definissem uma fronteira eficiente.
O scouting é um processo incrivelmente complexo. Primeiro, porque não há uma única forma "correta" de avaliar jogadores – cada scout tem a sua metodologia e crenças, o que significa que o mesmo jogador pode ser avaliado de forma diferente por diferentes scouts. Segundo, porque não existe uma fórmula mágica para definir talento. O talento é um conceito abstrato e multifacetado, tornando cada jogador único e difícil de avaliar com absoluta certeza. Por fim, o scouting é altamente subjetivo; por vezes, é difícil colocar em palavras o que vemos (aquela inexplicável intuição de "olho de treinador").
A minha missão era enfrentar alguns desses desafios estruturando o processo de scouting de uma forma clara e objetiva – ajudando clubes e stakeholders a racionalizar as suas convicções e a suportar a tomada de decisão.
Para atingir este objetivo, desenvolvi um Modelo Multi-Critério de Avaliação de Performance de Jogadores – um ponto de partida para as tarefas de observação no terreno: DataScouting. Mas rapidamente percebi que o scouting não é um processo único para todos. As necessidades e preferências de cada clube variam consoante a sua visão, estilo de jogo e características desejadas nos jogadores. Por isso, incorporar as preferências dos decisores (Chief Scout, Diretor Desportivo ou Treinador Principal) no modelo tornou-se essencial. Esta abordagem permitiu-me:
1. Identificar o conjunto de critérios mais valorizado para cada posição e/ou função, com base no contexto da equipa.
2. Abandonar a ideia de que todos os critérios têm o mesmo peso – algumas características são mais importantes para certas posições e funções.
3. Reconhecer que os critérios não são isolados – algumas características criam sinergias, melhorando o desempenho global.
4. Tornar o processo transparente para todos os stakeholders, estabelecendo um perfil claro e intuitivo do jogador para cada posição.
Nada me teria deixado mais orgulhoso do que implementar este projeto no meu clube – aquele que me formou – o Sporting Clube da Covilhã. O primeiro passo? Adaptar o modelo ao contexto do clube: Qual é a visão do clube? De onde vêm, habitualmente, os jogadores?
O passo seguinte foi a recolha de dados. O clube nunca tinha tido um departamento de scouting formal. Considerando o enorme sucesso da base de dados do Football Manager no recrutamento global, utilizei os seus dados como base para o meu processo.
A prioridade da equipa era reforçar a posição de avançado, o que levou à definição de dois perfis distintos: um avançado fixo e um avançado móvel. Considerando as restrições financeiras do clube, os jogadores-alvo vinham da quarta divisão (Campeonato de Portugal). No entanto, para estabelecer um ponto de referência para a qualidade, também recolhi dados sobre avançados da segunda e terceira divisões (Liga 2 e Liga 3).
O decisor selecionou o conjunto de critérios para cada cenário e hierarquizou os critérios que mais valorizava para cada perfil de avançado. Depois, identificou os efeitos de sinergia entre características e ajustou as escalas em conformidade. Os resultados?
• Avançado Fixo: Dos 229 avançados avaliados, 38 estavam na fronteira eficiente, mas apenas 7 jogavam no Campeonato de Portugal.
• Avançado Móvel: 57 avançados foram classificados como eficientes, sendo que 18 jogavam no Campeonato de Portugal.
• Apenas um avançado era comum a ambos os perfis.
Este grupo de jogadores eficientes foi então referenciado para tarefas de scouting no terreno. Os avançados que não estavam na fronteira eficiente também foram avaliados, permitindo-nos identificar os critérios em que ainda tinham lacunas em relação aos que estavam na fronteira eficiente. Além disso, classificar os avançados ineficientes ajudou a avaliar o quão perto estavam de alcançar a fronteira eficiente, fornecendo insights sobre o seu potencial de desenvolvimento.
No final do projeto, o modelo também serviu como uma ferramenta de validação para o processo de scouting. Os jogadores identificados pelo decisor foram testados contra o modelo: dois em cada três foram classificados como eficientes, enquanto o terceiro ficou classificado em sétimo, muito próximo do limiar de eficiência. Isto forneceu uma confirmação baseada em dados da avaliação do decisor.
Em última análise, um scout é mais do que um mero identificador de talento – é um facilitador de decisões. Afinal, se um engenheiro conseguiu liderar a seleção nacional de Portugal, talvez haja espaço para engenheiros no futebol.